Na mesa, durante o almoço, meu pai disse: “ ... hoje faz 50 anos que cheguei a São Paulo...”
É estranho, pois ele não se lembrava do que comeu no café daquela manhã, mas se lembrava daquela data longínqua!
Meu papito veio muito menino para a cidade que tinha promessas de trabalho fácil, bons salários e conseqüentemente uma vida melhor.
Não queria mais trabalhar do campo.
Ele deixou para traz a vida com a família em um sítio pequeno no nordeste do país, a mãe e os irmãos menores.
Para conseguir o dinheiro da viagem trabalhou no corte de cana.
Em sua cabeça sempre esteve o desejo de um dia voltar, mas com uma condição: estar bem de vida e levar muitos regalos para a mãe querida. Há 50 anos São Paulo realmente tinha emprego para todo mundo. Meu pai costuma dizer que se você passasse em frente de uma loja era bem provável que te “laçassem” para ofertarem trabalho.
O problema do meu pai era não ter estudo, por isso os trabalhos que facilmente ele conseguia arranjar eram os braçais.
As estradas de rodagem por ai têm o dedinho do meu pai.
Durante muitos anos foi padeiro fazendo o triste turno da madrugada.
A certa altura da vida decidiu ser seu próprio patrão.
Teve boteco, avícola, oficina mecânica, loja de autopeças. Hoje está aposentado ( mas nem de longe sossegou ).
Vez ou outra ele me vem com umas idéias estranhas. Quer ir para Bertioga trabalhar na praia, ou então conseguir um ponto para banca de revista.
Sua saúde não está bem e fico feliz dele já não mais tocar nesse assunto.
Não entende que seu tempo de trabalhar já foi.
Agora ele só tem que descansar.
Meu Deus! 50 anos é uma vida... e ele se lembra como se fosse há pouco de quando era ainda menino chegando de madrugada nesta imensa cidade de pedra.
Não deu tempo de voltar com regalos para minha avó. Ela morreu antes.